Estou deitado sobre a areia. De volta à cidade que por tempos vivi, visto uns calções curtos, azuis com listras brancas, e uma camiseta preta. Calço umas velhas sandálias, as quais nem me recordava possuir. A noite está quente apesar da estação. Escrevo, em um caderninho de capas pretas, os sinuosos caminhos da floresta agreste que desabrocham nestes cansados olhos azuis, nesta barba hirsuta e branca, neste peso de quase alma, neste corpo de reflexo de tempo. Estas linhas de tinta fresca são um corrimão de pensamentos soltos que se entrelaçam com a memória lívida dos passos, leves e curtos, que descrevem a fluidez sintética de uma vida singular rasgada pelas folhas soltas de um plural anêmico. Com estes dedos delgados e surrados pelo longo tempo de ofícios manuais, que tanto amaram, escrevo o braseiro em que se diluiu a arquitetura de um romance coalhado de sombras e de cinzas, na estética de um balouço amante. Estes traços que componho, na surdez desta praia, são os vincos de uma frigidez que me assolam esta carne, fogosa e carente, com a timidez de palavras rústicas e com a fragilidade emocional com a qual rebusco cada cântico desta sonolência à flor da pele. A elegância da noite revela-me a pobreza do meu tempo e assusta-me, com a clareza do seu hábito, esta presença solitária no recanto de uma praia que é a fluidez dos meus afetos. Levanto-me, recolho os meus pensamentos, e encaminho-me para o Molo di Ponente. Não espero muito tempo. Entro e sento-me num lugar, resguardado pelo prazer do seu isolamento. No Le spiagge del porto, apanho o autobus 45 - Panzini/Arno - até à Via Vittor Pisani. Atravesso a rotatória, entro na Via Silio Italico, e chego, a casa, conformada com os caprichos da solidão. Dispo-me, tomo uma ducha rápida e preparo uma refeição ligeira. Depois, sento-me no sofá e, sob os clarões sonoros de "Violator", do Depeche Mode, escrevo no meu caderninho com a suavidade de uma brisa tranquila as imagens deste passado que germinaram em futuro.
Assinado por Renato Cresppo
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